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Pesquisa

Quebrando o código: como novas pistas em nosso sangue podem aprimorar nossa compreensão das doenças e impactar a forma como as tratamos

Quebrando o código: como novas pistas em nosso sangue podem aprimorar nossa compreensão das doenças e impactar a forma como as tratamos

 

Há quase 20 anos, os líderes científicos no Reino Unido iniciaram um estudo ambicioso: criar o UK Biobank, um banco de dados biomédicos exclusivo e poderoso para pesquisas em saúde pública. Entre 2006 e 2010, o UK Biobank recrutou meio milhão de voluntários em todo o Reino Unido, recolhendo informações biológicas e dados relacionados à saúde (incluindo informações genéticas, de biomarcadores, de estilo de vida, de imagiologia e ambientais) para permitir descobertas científicas na prevenção, no diagnóstico e tratamento de doenças. O resultado? Um impactante estudo de coorte populacional de longo prazo, disponível para pesquisadores de todos os lugares para ajudar a melhorar nossa compreensão de doenças como as cardíacas, o câncer ou a depressão, para que terapias mais direcionadas possam ser desenvolvidas para os seus tratamentos, suas curas e até mesmo suas prevenções.

Recentemente, houve um marco importante nesses esforços, pois a revista científica Nature publicou um artigo compartilhando descobertas preliminares do UK Biobank Pharma Proteomics Project (UKB- PPP), uma colaboração que gerou o maior conjunto de dados proteômicos do mundo.

O que é proteômica e como ela pode nos ajudar a impulsionar o progresso em direção à medicina de precisão? Conversamos com Chris Whelan, Ph.D. da nossa equipe de P&D Data Science & Digital Health da Janssen – que atuou como líder da colaboração e autor correspondente do artigo – para saber mais sobre o que isso significa para a ciência e para os pacientes.

P: Primeiramente, o que exatamente é proteômica?
Chris Whelan:
Quando as pessoas pensam nas causas das doenças, geralmente pensam na genética – se a sua mãe ou o seu pai tivessem uma determinada condição, você poderia ter uma chance maior de desenvolvê-la devido à sua composição genética. Os avanços em nossa compreensão do genoma humano nos últimos anos, incluindo a conclusão da primeira sequência genômica completa pelo Projeto Genoma Humano no ano passado, melhoraram tremendamente a nossa compreensão das doenças.

Mas os genes são apenas uma parte de um quebra-cabeça muito complexo. Tomemos como exemplo duas pessoas que são geneticamente predispostas a desenvolver uma determinada doença – uma desenvolve a doença, enquanto a outra não. Por que isso acontece, biologicamente falando?

Uma visualização 3D do Reino Unido, que é composto por antígenos, rodeados por anticorpos, que produzem um sinal de concentração de proteína após a ligação de antígenos.

É aqui que entram as proteínas. As proteínas são os produtos finais dos genes, são os blocos de construção que formam todos os organismos vivos. Simplificando, a proteômica é o estudo em larga escala dessas proteínas, incluindo sua estrutura, sua composição e como elas funcionam e interagem umas com as outras no corpo. Com a proteômica, podemos medir milhares de proteínas que circulam na corrente sanguínea de uma pessoa, construindo a história de como o genoma humano e o proteoma humano influenciam o início e a progressão da doença.

P: Conte-nos mais sobre seu estudo recente publicado na Nature.
Chris:
O artigo da Nature descreve a formação e a pesquisa preliminar do UK Biobank Pharma Proteomics Project (UKB-PPP), uma colaboração entre 13 empresas biofarmacêuticas, incluindo a Janssen. O UKB-PPP foi formado para medir quase 3.000 proteínas do plasma sanguíneo, coletadas de 54.219 participantes do UK Biobank, tornando-o o maior estudo de biomarcadores sanguíneos do mundo.

Como primeiro passo – e o foco desta publicação recente – todas as treze empresas estudaram em colaboração como as concentrações de proteínas circulantes são geneticamente reguladas. Conduzimos estudos de associação genômica ampla (GWAS) - triagens do genoma sem hipóteses dos cromossomos 1 a 23 - para construir uma biblioteca de mais de 14.000 variantes genéticas que influenciam os níveis de proteína no sangue - 80% das quais eram anteriormente desconhecidas.

Esta biblioteca – que estará disponível para cientistas de todo o mundo através do UK Biobank nas próximas semanas – pode ser usada para desenvolver um quadro mais matizado de vias biológicas complexas, como as do sistema imunológico. Também pode nos ajudar a estudar relações causais entre as proteínas e doenças, ajudando-nos a identificar quais proteínas poderiam servir como alvos eficazes para novos medicamentos. A inteligência artificial (IA) e a aprendizagem automática (ML) desempenharão um papel fundamental aqui, permitindo-nos captar padrões que seriam de difícil identificação pelo olho humano.

Juntamente com a análise genética, também comparamos diretamente os níveis de proteína em casos de doenças com os grupos de controle. Isso capturou diversos biomarcadores sanguíneos bem estabelecidos usados em ambientes hospitalares, como o NT-proBNP para doenças cardíacas. Também encontramos associações de doenças menos estabelecidas que poderão, um dia, gerar novos biomarcadores poderosos. Por exemplo, uma proteína chamada Fator de Diferenciação de Crescimento 15 (GDF-15 em inglês) foi associada a 18 das 20 doenças mais prevalentes no UK Biobank, indicando que este pode ser um marcador geral de stress celular e, consequentemente, do estado de saúde de uma pessoa. Também observamos uma forte regulação positiva de proteínas inflamatórias em pessoas vivenciando episódios depressivos.

P: Por que isso é importante para a ciência e para os pacientes?
Chris: Uma melhor compreensão do que origina doenças complexas – não apenas a nível genético, mas a nível proteico – pode ter um enorme impacto nos nossos esforços de combate às doenças.

A maioria dos medicamentos modernos é desenvolvida tendo em mente uma única proteína-alvo. Na maioria dos casos, porém, múltiplas proteínas interagem para causar a doença. Se pudéssemos desenvolver medicamentos direcionados a coleções de proteínas simultaneamente, evitando suas interações causadoras de doenças, poderíamos aumentar potencialmente nossa capacidade de tratar, curar ou até mesmo prevenir doenças antes de seu desenvolvimento.

A proteômica também pode nos ajudar a compreender diferenças biológicas fundamentais entre pacientes com a mesma doença. A depressão, por exemplo. Alguns pacientes apresentam insônia, enquanto outros, problemas metabólicos; alguns respondem bem à primeira terapia, já outros sofrem de depressão resistente ao tratamento ao longo da vida. A proteômica poderia ajudar-nos a descobrir as vias biológicas que conduzem um “subtipo” de uma doença complexa comparada à outra. O que poderia, por sua vez, ajudar-nos a desenvolver terapias mais direcionadas e a fornecer os medicamentos certos aos pacientes certos, no momento certo.

P: Além da identificação de alvos, de que outra forma isso poderia impactar a P&D farmacêutica?
Chris: Estou mais entusiasmado com o potencial de uso da proteômica como ferramenta de previsão. Por exemplo, poderia haver um enorme impacto se pudéssemos prever se, e quando, uma pessoa poderia desenvolver uma doença e intervir precocemente. Ou se pudéssemos prever coisas como segurança, eficácia e toxicidade antes mesmo do início dos ensaios clínicos na vida real, o que poderia ajudar a garantir a continuação apenas com os candidatos mais promissores para o desenvolvimento clínico, potencialmente encurtando os tempos de desenvolvimento e trazendo inovação mais rapidamente aos pacientes necessitados.

P: Sabemos que este trabalho foi realizado em colaboração com muitos outros parceiros como parte do UK Biobank Pharma Proteomics Project (PPP). O que foi único nesta colaboração?
Chris: Além do enorme alcance deste esforço – um dos maiores consórcios industriais do gênero – o UKB-PPP é também uma colaboração no verdadeiro sentido da palavra. O fato de cientistas de empresas que de outra forma seriam consideradas “concorrentes” terem trabalhado em conjunto neste artigo é uma prova do potencial da proteômica como a próxima fronteira na biotecnologia. Ao longo dos últimos anos, pude testemunhar como outros cientistas estão usando o conjunto de dados de maneiras novas e impressionantes. É gratificante ver como este conjunto de dados e a colaboração por trás dele estão enriquecendo o já vasto conjunto de dados do UK Biobank e como já está abrindo caminho para novas descobertas emocionantes.

Isto também despertou o entusiasmo e impulsionou a colaboração dentro da Janssen – entre a equipe de I&D Data Science & Digital Health da qual faço parte, as nossas equipes de Discovery e colegas de todas as nossas áreas terapêuticas. A ciência – e a I&D em particular – é realmente como um esporte de equipe. Sinto-me muito feliz por trabalhar neste espaço em um momento em que os avanços na biologia, química e tecnologia permitem um progresso tão revolucionário. Estou incrivelmente animado para ver o que o futuro reserva.

Observação: o artigo também teve como coautoras Liping Hou, Ph.D., Principal Scientist, Population Analytics & Insights, Artificial Intelligence, Machine Learning & Digital Health, e Dawn M. Waterworth, Ph.D., Senior Director, Translational Sciences, Immunology, na Janssen R&D.

4 de outubro de 2023